O BANQUETE


Um mês antes de completar trinta anos, Fernanda andava agitada. Iniciaria uma nova década e tinha metas a cumprir: encontrar o parceiro para toda a vida, ter filhos e ser um sucesso na carreira profissional, o que é dito e sublinhado por várias celebridades sempre que têm algo novo a dizer. Deu de ombros e se concentrou nos preparativos.
A lista de convidados era pequena. Pensou em reunir para o almoço, suas amigas mulheres, dez criaturas muito especiais que se conheciam desde os tempos de colégio, amizade antiga, dessas que não se vê mais por aí. Depois à noite, a celebração continuaria na Lapa, numa rodade de samba e cerveja.
Quis fazer tudo sozinha. Deu-se ao luxo, apenas, de contratar um garçom para servir as bebidas e o almoço quando se sentassem à mesa.
Ligou para o serviço de bufê e pediu o mulato mais bonito e competente da agência.
No dia do aniversário, Fernanda acordou radiante. Antes do café-da-manhã, deu uma corrida de uma hora, chegou faminta, comeu e pôs às mãos à obra. Foi ao supermercado, encheu sacolas e mais sacolas e não esqueceu de nenhum item.
Esmerou-se no preparo dos quitutes. Passou a manhã trabalhando na cozinha, no meio de vapores e sabores. Quando tudo estava pronto, arrumou a mesa. Toalha de linho rendada da Ilha da Madeira, com os respectivos guardanapos, talheres de prata, taças de cristal, da Schmidt de Santa Catarina, sua terra natal, e arranjo de rosas brancas no centro da mesa.
Ao se dirigir ao banheiro, a campainha soou. Ao abrir a porta, seus olhos se maravilharam com a figura de Gabriel, um anjo cabloco de olhos verdes de tirar o fôlego. Deu as boas vindas, mostrou-lhe o quarto para trocar de roupa e foi tomar banho em êxtase.
Demorou-se mais do que o habitual. A água tépida estava no ponto, deixou-se relaxar embaixo da ducha possante. Vestiu-se com apuro e saiu do quarto exalando Allure. Ao chegar à sala, reparou que causou impacto no anjo Gabriel, que disfarçou, mas ela notou. Notava tudo.
Logo, a campainha soou insistentemente. Eram as amigas que chegaram juntas, falando alto na maior animação. Quando viram Gabriel, o silêncio se fez. Por alguns segundos nem os passarinhos se fizeram ouvir, e era primavera.
Fernanda apresentou o garçom, Gabriel veio me ajudar, cabeças giraram, sorrisos nervosos escapuliram, cheiros se misturaram, a excitação pairou no ar. Tudo ficou elétrico, cheio de vida. As mulheres esbanjavam juventude, sexualidade, vida. Gabriel era o contraponto, seu rosto sério não se deixou trair, controlou-se.
As bebidas foram servidas, o álcool entrava suavemente no organismo das mulheres, deixando-as mais soltas, irreverentes, aguçadas. Beberam, dançaram e contaram muitos segredos. Também fizeram planos para o futuro.
Fernanda anunciou o almoço. Foram abraçadas para a mesa. Gabriel serviu vários pratos de salada. Beberam mais vinho. Quando vieram os pratos quentes, constrangimento geral. Estavam de dieta. Olharam deliciadas para os pratos e comeram com os olhos. Na hora da sobremesa, confabularam. Desistiram dos pudins e pavês, olharam gulosamente para Gabriel, que não teve jeito de escapulir. Tiraram suas asas com cuidado e foi comido com sofreguidão por Fernanda e sua turma de amigas. Chuparam até os ossos.

Um sucesso o almoço de aniversário de Fernanda.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

DONA ANGÉLICA

O REI E SEUS FILHOS

ROTINA