DIÁLOGO IMPROVÁVEL ENTRE UM HOMEM E UM SAPO



                O entardecer caía sobre o vale. Um frio delicioso entrava, como a pedir licença, pelo suéter fino do homem e o fazia estremecer levemente. Ele saiu de sua pequena casa para respirar o ar puro trazido pelo vento vindo da montanha. À sua volta seus cães corriam, prá lá e pra cá, felizes por estar na companhia de seu dono.
            O homem percorria o jardim, que circundava o muro da casa. Gostava daquele pedaço florido, cenário único de diversos matizes: tirava as folhas secas das árvores, colhia o mato e examinava a terra atentamente à procura de formigas, os predadores de suas hortênsias e rosas. Quando viu o sapo, escondido entre as folhagens, olhou-o com olhos de conhecedor e o interpelou.
            - Como pode ser tão feio e repugnante?
            - Olha que você não fica atrás.
            - Não lhe meto medo?
            - Confesso que um pouco. Sua altura e largura são imensas, e sempre acho que vou ser esmagado por seus pés. Mas tenho vontade de conhecer a sua intimidade. Quando saio de minha toca, vejo que você se recolhe à sua. Fico aqui do lado de fora invejando a quantidade de luzes de sua casa e curioso para saber o que você faz.
            - Nada de mais. Leio, vejo a televisão e vou dormir.
            - Ah, sim ( mas ele não tinha a menor ideia do que era isso)
            - Você tem medo dos meus cachorros?
            - Não, eles não me aborrecem, nem eu a eles. Talvez se me mexer eles possam me atacar, mas fico quietinho no meu canto e eles passam por mim sempre correndo, sempre arfando, não sei como não se cansam.
            O homem sorriu.
            - Sabe de uma coisa? Você não é tão feio como parece.
            - Nem você.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

DONA ANGÉLICA

O REI E SEUS FILHOS

ROTINA