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Mostrando postagens de janeiro, 2014

RASTROS DE SANGUE

inverno manhã de verão uma suave aragem convidava ao lazer cabelos ao vento e muita disposição eu caminhava leve como o dia azul num olhar distraído olho pro chão vejo pegadas        de sangue começo de frio o vento mais forte tremo de medo passos e pegadas se confundem sem  fim curvei-me ao peso da angústia e fui pensando cinza queria achar o cão ferido numa esquina o encontrei e o dia virou noite

PEDRO, O SAPO

            Ele me olhou, eu o olhei e gritei. Sai, sai, e peguei a vassoura. Ele continuou me olhando, em guarda, ambos assustados um com o outro. Consegui varrê-lo para fora da casa. Com cuidado, porque tenho respeito por qualquer ser da terra, racional ou irracional, com penas, sem penas, com patas ou com pernas. Ele se cagou de medo e pequenas fezes sujaram o chão. Gritei de nojo, entendi o seu pavor, porque também eu não estava no meu normal, mas limpei tudo e fechei a porta. Não o vi por alguns dias, mas eis que num domingo ensolarado, lá estava ele no centro da sala, relaxado em cima do tapete, assuntando em volta. Dessa vez nem me assustei. Enxotei-o mais uma vez, e ele saiu saltando de um jeito engraçado pela porta. São feios os sapos. Outra feita se postou na porta me olhando fixamente. Os cachorros o ignoravam solenemente e eu passei a não me incomodar com a sua presença. Estabelecemos um elo de intimidade e comecei a chamá-lo de Pedro. Ele passou a ser presença constante n

INVENTÁRIO

pelas cicatrizes e marcas de meu corpo traço a minha estória criança traquina joelhos arrebentados pernas estropiadas as marcas estão todas aqui desfiguradas esmaecidas pelo tempo olho com respeito este inventário de cicatrizes estória daquela criança sempre com alguma coisa a sangrar a gozar a doer hoje são as cicatrizes da alma a estória dessa mulher doloridas e sangrentas farpas da alma coração esfaqueado que ainda teima em bater

O BANHO

                                                                O dia estava quente e enquanto seu filho Pedro e o amigo Bruno brincavam na sala, Cristina foi para o banheiro tomar uma ducha para se refrescar. Distraída, deixava a água descer pela cabeça, olhos fechados, quando a porta do boxe se abriu e entraram os dois meninos para tomar banho com ela. Levou um baita susto e ficou na dúvida se mandava os meninos saírem ou se agia como se nada houvesse. Era uma mãe moderna que tomava banho com o filho, mas ali estava um amigo, como deveria proceder? Será que na casa dele a mãe também tomava banho com o filho? Não era uma boa hora para perguntar e, aflita, mas sem dar a perceber, disse que o banho dela tinha terminado, mas que eles poderiam tomar o deles. Enrolou-se na toalha e saiu de fininho. Foi para a cozinha, preparou uma dose de uísque, e, sentou-se no sofá. Os meninos demoraram uma eternidade para sair do banheiro. Tudo passou pela cabeça dela, coisas safadas que meninos e m

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HISTÓRINHA QUASE REAL

                                              Lembro-me bem dela. Cabelos escuros, lisos, bem curtinhos, imensos olhos negros e pestanudos, nariz bem delineado, boca carnuda e dentes brancos, lindos. Corpo escultural encimado por um pescoço longo, seios redondos, como dizia um amigo dela, apaixonado: no tamanho certo para caber na minha mão. Enfim, a menina era um espetáculo. Os homens a cobiçavam e as amigas a invejavam. Chamavam-na de Beth, a caçadora. E para tentar descobrir algum defeito, falavam das pernas, finas e nada glamorosas. Um detalhe, convenhamos.                  Morava na Penha, sua família era bem humilde, numa casinha modesta, e ela tinha jurado que aquela vida não era a que queria para si. A mãe era costureira e o pai vivia desempregado. Tinha uma irmã, as duas se detestavam, viviam às turras e competiam pelo amor da mãe, totalmente voltado para Beth. No entanto, as amigas das duas irmães eram praticamente as mesmas.                 Elas eram muito parecida

VÉSPERA DE NATAL

                                       Depois de longos meses de chuva quase que contínua, o tempo deu uma trégua. Ainda chovia na véspera de Natal, os acidentes nas estradas se sucediam, cidades amanheciam alagadas, aqui e no mundo e Euclides se perguntava quantas cidades teriam possibilidades de sobreviver após tantas catástrofes. Não queria ser testemunha ocular daquilo que o amedrontava tanto: o  fim de cidades devastadas pela água. Que morresse antes.             Era um excêntrico, não gostava de festas, não dava muita importância às datas, como essa – Natal-  por exemplo, mas celebrava o seu aniversário com uma alegria genuína. Por anos a fio passava a data sozinho, feliz desde a hora em que acordava até quando ia dormir. Preparava o café da manhã com todas as gostosuras que gostava; encomendava o seu prato predileto no restaurante mais sofisticado do bairro, e que viesse acompanhado de um bom tinto francês, e sempre ganhava a sobremesa de brinde. Não convidava ninguém, mu