AH, SE NÃO FOSSE O VENTO, NADA DISSO ACONTECIA

 

 

Vânia e Rodrigo se conheceram pelas beiradas, literalmente. Ele a via sempre na parada do ônibus, tão jovem, com a filha bebê nos braços. Intrigava-se: caramba, ela não deve ter passado dos quinze, como é que pode ser mãe? Nunca a viu acompanhada, até que num sábado, na pelada do bairro, um casal novo apareceu, era Vânia, com a filha e o companheiro Márcio.

Chegaram timidamente, como não querendo ser vistos, embora ele estivesse louco para jogar, e para isso tinha que ser visto, de alguma maneira. Rodrigo era o capitão do time, apertaram-se as mãos e o jogo começou. Rodrigo pouco olhou para Vânia, concentrado no jogo. Márcio agradou ao time, jogou bem e ao final apresentou a mulher aos seus novos companheiros. Foi então, que Rodrigo a olhou bem, como era linda e como era jovem, uma menina. Soube que tinha 14 anos, namorava Márcio desde os 12 e ele apenas dois anos mais velho do que ela.

Agora, quando a via no ponto de ônibus, oferecia carona no seu carro caindo aos pedaços. Vânia disse que Márcio era mecânico e sugeriu que ele deixasse o calhambeque na oficina e ele sairia novo, tinindo de bonito. E acrescentou, meu marido é craque na oficina e na bola. Riram juntos. E o dito foi o feito. Márcio era profissional dos bons e o carro saiu recauchutado e funcionando bem melhor. Ficaram amigos.

Dois anos depois nasceu um menino e Rodrigo o escolhido para padrinho. Rodrigo namorava Maristela, professora, ciumenta e que não gostava de Vânia, pois sentia o potencial de amor que Rodrigo tinha por ela, embora nem ele, nem Vânia e muito menos Márcio soubessem do fato. Maristela e Rodrigo viveram juntos por 10 anos, tiveram uma filha, e aparentemente tudo andava nos conformes.  Mas, a vida prega peças, nem sempre ensaiadas. Numa virada do tempo, um vento mais selvagem e audacioso, levantou as saias das moças, levaram cheiros e odores selvagens pelo ar. Márcio se apaixonou por Maristela, e Vânia por Rodrigo. Viveram felizes para sempre.

 

II

 

Moema era conhecida de Mirtes desde os tempos do colégio. Fizeram juntas o ensino médio e depois cada uma foi para um lado. Casaram, tiveram filhos e um dia Moema foi admitida para trabalhar na farmácia da família de Mirtes, uma das três novas funcionárias sob a gerência de Mirtes. Muito trabalho, com pitadas de diversão, a farmácia era ponto de encontro de uma turma que conhecia as moças desde meninas, e sempre havia café quentinho nos fundos da farmácia, oferecido aos frequentadores. Por vezes, se esqueciam que estavam numa farmácia, principalmente se o papo estava bom, as risadas se faziam ouvir.

Mas, a vida prega peças, nem sempre ensaiadas. Numa virada do tempo, um vento mais selvagem e audacioso, levantou as saias das moças, levaram cheiros e odores selvagens pelo ar. Moema se apaixonou por Mirtes. Ruminou a paixão silenciosamente, embora os olhares gulosos para a amiga, fossem percebidos pelos filhos de Mirtes, que nada falaram, mas que se divertiam imenso com a “novela silenciosa”, que é como eles se referiam ao fato.

Aos poucos, o ciúme foi criando um corpo estranho dentro de Moema e, por conseguinte, qualquer homem que se aproximasse de Mirtes, num tipo cerca-lourenço, era visto e avaliado como inimigo em potencial.  Mirtes namorava um homem mais jovem do que ela, bonito e engraçado. Chegava na farmácia fazendo piada e, foi numa dessas que Moema disparou: babaca, e ainda se acha engraçado. Mirtes ouviu e não deixou passar. Pegou a funcionária pelo braço levou-a para o banheiro e deixou bem claro que não admitia falta de respeito com os clientes. Moema chorou, se disse incompreendida, e disse que agia assim porque estava apaixonada. Por quem? Perguntou Mirtes, receosa, achando que era pelo seu namorado. Por você, choramingou Moema.

Mirtes caiu sentada no vaso sanitário, em boa hora com o tampo fechado, mas pragmática encerrou o caso ali mesmo. Está de aviso prévio, daqui há um mês lhe quero ver pelas costas. Os filhos disseram que ela foi dura, que estávamos em 2021, que ela deveria ser mais civilizada e entender a escolha sexual da outra. Não quis nem ouvir e encerrou ali mesmo uma provável história de amor.

 

III

 

Era um domingo, ele encarapitado no alto do telhado, colocava uma nova telha, perdeu o equilíbrio e rolou. Sem conseguir evitar o tombo, desabou no chão e não levantou. Um deus-nos-acuda, isso não pode estar acontecendo, a mamãe acabou de morrer.

Do horror ao alívio: o pai abre os olhos e pergunta o que tinha acontecido. As filhas não sabiam se agradeciam aos céus ou tentavam levantá-lo. Samuel, um dos genros, achou prudente não tocar nele, e chamar a ambulância. Rezas são ouvidas, o celular dele tocou, é a namorada. Sabendo do ocorrido e do hospital para o qual ele seria levado, saiu em desabalada carreira. Levou consigo os filhos, que até então nem sabiam que a mãe estava de namorado novo.  No hospital, depois de se certificarem que ele estava bem, a família foi entrando aos poucos no quarto.

A vida prega peças, nem sempre ensaiadas. Numa virada do tempo, um vento mais selvagem e audacioso, levantou as saias das moças, levaram cheiros e odores selvagens pelo ar. E então, a surpresa do ano: quando ela entrou com seus filhos, eles eram nada mais, nada menos, funcionários de sua firma. Os moleques que entraram como aprendizes, e continuaram por lá, agora adultos, chamavam-no de pai e à falecida de segunda mãe. Dessa vez, um final feliz. Acontece.

 

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